sexta-feira, outubro 20, 2006

debaixo da chuva

Chove. O dia amanhece em tons de cinza baço, contrastando com as cores molhadas do chão: verdes intensos, terra enlameada, alcatrão escuro … O ar cheira a Outono, um um odor a maresia sem sal, temperado com erva de pasto. E em toda a parte ouve-se o mesmo murmúrio: água que escorre na berma dos caminhos, beirais que pingam, gotas que batem ao de leve sobre as árvores e telhados...

Esta humidade espessa parece deformar a visão das coisas, dilatando-as. E não sei se por isso, ou outras razões, creio que também inchamos por dentro. Como se a brisa da chuva trouxesse consigo os medos e o desassossego, sensações demasiado cheias…

Vê-se em cada rosto que passa, uma pressa que não é só de fugir da chuva que cai. Estugam-se os passos em urgência de chegar a outro lugar, ou simplesmente de fugir de onde se está… Como se fossemos andorinhas e em algum momento tivéssemos perdido as asas. Agora, em vez de voarmos para longe, ficamos aqui, debaixo da chuva.

1 comentário:

Miguel Marujo disse...

Bem sei que choveu muito nessa cidade de canais, água e mais água, na quinta à noite, onde cheguei já de madrugada. E voltou a chover como sem eira nem beira no domingo, afugentando todos da rua, excepto aqueles que saíam, como nós, da cidade. Agora: o sol brilha timidamente, e já podes sair sem medo. As asas vão voltar a bater.